Crônicas de Elyrion - O Vale Esquecido Cap.9

 Capítulo 9



A Vila de Brenhal

O amanhecer chegou silencioso. Uma névoa espessa cobria o chão da floresta, e o cheiro de terra úmida preenchia o ar. Dareth foi o primeiro a se levantar, ajeitando os poucos pertences e extinguindo o restante da fogueira com o pé.

— Movam-se. Temos chão até o Vale Esquecido.

As crianças, ainda sonolentas, organizaram suas coisas. Os cristais que sobraram foram cuidadosamente guardados por Kael e Mira. Nira observava o brilho suave deles, tentando entender o que aquilo significava.

Seguiram por trilhas estreitas, onde as árvores pareciam se fechar sobre eles, os galhos antigos retorcidos como braços ossudos. O som da floresta era diferente ali, mais contido, como se as próprias criaturas temessem algo adiante.

Após horas de caminhada, a vegetação começou a rarear e, aos poucos, casas de pedra e madeira surgiram ao longe, fumacinhas subindo de algumas chaminés. Era uma vila pequena, cercada por paliçadas de troncos e estandartes esgarçados, onde o símbolo de um lobo alado ainda podia ser visto.

— Que lugar é esse? perguntou Lian, os olhos brilhando de curiosidade.

Dareth respondeu sem diminuir o passo.

— Brenhal. Última vila antes do Vale Esquecido. Se tiverem sorte, podem encontrar o que precisam antes que as coisas piorem.

Ao atravessar o portão de madeira, os olhares dos aldeões recaíram sobre o grupo. Alguns homens mais velhos, de barbas longas e rostos marcados, suspenderam o olhar de suas forjas e barracas. Crianças pequenas se escondiam atrás das mães. Havia algo de sombrio ali, mas também uma familiaridade, como se o lugar tivesse visto muitas histórias passarem.

Um mercador gorducho, usando um colete manchado, aproximou-se.

— Estranhos… não é comum ver gente nova nessas terras. Precisam de mantimentos? Armas, quem sabe?

Kael ergueu uma sobrancelha.

— Você vende armas pra crianças?

O homem soltou uma risada rouca.

— Pra quem sabe usá-las, sempre.

Ele apontou para uma tenda improvisada onde lâminas gastas, arcos, adagas e frascos de poções rústicas estavam expostos. Mira se aproximou de uma pequena corrente prateada com um cristal azulado na ponta.

— O que é isso?

— Amuleto de concentração, respondeu o mercador. Ajuda jovens conjuradores a manter o foco. Só funciona se a energia dentro de você já estiver acordada.

Nira, curiosa, se aproximou de uma pequena mesa com frascos coloridos.

— O que são essas poções?

— Essência herbal. Cura ferimentos leves e… essa aqui fortalece o corpo por um tempo. Ele piscou. Coisa boa antes de enfrentar as criaturas do Vale.

Dareth chamou-os com um gesto.

— Comprem o que puderem. Usem o que aprenderam. Não gastem com tolices.

Ele próprio trocou algumas moedas por um manto reforçado e um punhado de pedras encantadas.

Enquanto os jovens exploravam as poucas lojas e barracas, um velho se aproximou de Nira. Seus olhos eram brancos como se a cegueira tivesse chegado há anos, mas sua voz era forte.

— Vocês carregam o peso do Antigo Nome… Eu senti isso no vento.

Nira hesitou.

— Do… quê?

Mas o velho já se afastava, sumindo na multidão.

Kael voltou segurando um par de adagas de cabo de osso.

— Isso aqui vai servir.

Mira havia conseguido uma bolsa de couro com pequenas runas bordadas — para guardar seus cristais de Essência.

Ao fim da tarde, reuniram-se novamente junto a Dareth.

— Pronto? perguntou ele.

As crianças assentiram.

Antes de deixarem a vila, um aldeão mais jovem se aproximou, entregando-lhes um mapa velho e desgastado.

— Isso leva até a entrada menos vigiada do Vale. Há perigos, mas menos patrulhas.

Dareth pegou o mapa sem dizer palavra.

— Se morrerem, a culpa é de vocês.

Os aldeões riram, mas o tom era mais nervoso do que alegre.

Já na saída, Nira percebeu algo. Ao tocar a pequena pulseira de contas que comprara, uma sensação estranha percorreu seu corpo — uma leveza, como se seus sentidos estivessem mais apurados.

Ela apertou o objeto no pulso, sem comentar nada.

O grupo seguiu para o Vale Esquecido.

O sol começava a se pôr e, à distância, podiam ver as montanhas envoltas em neblina azulada. Um lugar onde os ecos antigos ainda viviam e onde as lendas diziam que a própria terra respirava.

— Lembrem-se, disse Dareth sem olhar para trás, aqui ou se aprende rápido… ou não se volta.

Eles caminharam adiante.


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